quarta-feira, 25 de fevereiro de 2004

Aqui vai aço... MST

"Missão impossível?

1- O FC Porto, em minha opinião, ultrapassou brilhantemente a fase de consolidação do Campeonato que, entre outras dificuldades, envolvia as deslocações à Luz e a Alvalade, a par da manutenção em prova na Taça de Portugal. Tal como aqui escrevi há meses, para voltar a ser campeão, o FC Porto precisava de chegar aqui, ao jogo com o Manchester, com suficiente avanço no campeonato que lhe permitisse precaver-se contra eventuais percalços internos motivados pelo excesso de jogos, de competição e de stress. Nunca é de mais realçar o grau de exigência e de esforço totalmente diverso de uma equipa que, a par das competições internas, se bate simultaneamente ao mais alto nível europeu, face a concorrentes que apenas têm de se concentrar em jogos semanais e internos. E o facto é que o FC Porto conseguiu chegar a esta fase de todas as decisões com o Benfica afastado do título e a concorrência reduzida a um persistente Sporting que, mesmo assim, está a distância razoável embora não decisiva de sete pontos, que, na verdade, são oito. Ainda não é o título ao virar da esquina, mas é uma posição altamente confortável e o máximo humanamente exigível a quem, além do mais, sofreu a baixa insubstituível de Derlei — apenas o melhor jogador do campeonato — somada a uma onda de lesões que, como quase sempre, veio na pior altura.

2- Para o jogo de amanhã, de grau de exigência absoluto, José Mourinho depara-se com um cenário quase devastador. Com Derlei, Alenitchev e César Peixoto magoados, Maciel e Sérgio impedidos de jogar na Europa, Costinha castigado e Maniche eMarco Ferreira em dúvida, são sete ou oito baixas entre o «núcleo duro» dos 18/20 jogadores que constituem a estrutura habitual de uma equipa de alta competição. Isso, mais o facto de, entre as baixas, se contarem todos os flanqueadores da equipa, reduz claramente as opções de Mourinho e deixa-o sem soluções de recurso— ou acerta à primeira, ou não há emenda possível. E o que poderá fazer Mourinho? É manifesto que não tem alternativa senão jogar em 4x4x2. Mas um 4x4x2 que não deixa grandes ilusões quanto às possibilidades de contra-ataque, porque nem Jankauskas nem McCarthy são jogadores para assegurarem por si o contra-ataque, pelo contrário, ambos são pontas-de-lança clássicos para serem servidos a partir dos extremos... que não há. Assim sendo, parece que a única solução ofensiva háde ter que residir no meio-campo. Uma noite de inspiração de Deco e Maniche (este, se jogar) é essencial, mas pode não ser suficiente. Ontem, aqui em A BOLA, aventava-se a hipótese de Mourinho fazer entrar Ricardo Costa para defesa-direito e chegar Paulo Ferreira para o meio-campo. É uma solução que já tem sido testada e, a meu ver, sempre sem resultados eficazes, para além do facto de essa ser o oposto de uma solução que reforce a capacidade ofensiva e desequilibradora do meio-campo. Se aceitarmos que as hipóteses de chegar ao golo terão, por força das circunstâncias, de vir essencialmente do meio-campo, eu penso que, à primeira vista, a solução lógica será a oposta. Ou seja, o Carlos Alberto, um repentista e desequilibrador nato, o tipo de jogador que, quando em noite inspirada, mais mossas pode causar a equipas inglesas. Mas, com ou sem Carlos Alberto, o problema principal de Mourinho vai ser quando olhar para o banco e constatar que, além de defesas, só tem disponíveis jogadores que vêm de lesões, como Ricardo Fernandes e Bosingwa, ou jogadores pouco testados, como Bruno Morais — se a memória me não falha, o único avançado disponível, para além de Jankauskas e McCarthy. E se olharmos para o banco do Manchester United... Enfim, não há muito mais a fazer do que aquilo que Mourinho já disse: esquecer as contrariedades e jogar com coragem e alegria. A verdade é que, como ele também notou e todos sabemos, em condições normais, nenhuma grande equipa portuguesa se pode bater com uma grande equipa europeia. Quanto mais em condições anormais...

3- A Selecção de Scolari não me aquece nem me arrefece. Os jogos já disputados neste ano e meio não servem para estabelecer nenhum padrão, nem quanto a resultados, nem quanto a exibições, a não ser a mediania de uns e outros. Quando a Selecção entra em campo, seja contra quem for, não é previsível para ninguém que exibição irá realizar e que resultado irá obter. Tudo parece continuar eternamente dependente dos rasgos de inspiração de um Figo ou de um Pauleta, coisa que qualquer seleccionador de bancada é capaz de programar. Passado ano e meio, é difícil de perceber que progressos foram feitos em relação à liderança provisória de Agostinho Oliveira, assim como, em última análise, é difícil de entender para que serviram os treze ou catorze jogos de preparação já efectuados. Não há uma linha contínua de evolução e melhorias, não há sequer um esquema de jogo claro e definido. É evidente que a grande preparação será feita quando a Selecção se concentrar nos vinte dias antecedentes ao Euro, com todos os jogadores já libertos dos seus outros compromissos. Mas isso equivale a dizer que tudo poderia começar de novo, a partir daí, visto que em termos de qualidade de jogo adquirida não existe nada. Mas não é o caso: já todos mais ou menos podemos dizer quem são os 23 da escolha final de Scolari, o que significa que praticamente já não há lugares em aberto. Mesmo aquilo que poderia suscitar dúvidas parece já resolvido: Ricardo Carvalho não será titular, pelo menos de início, apesar de ser, à vista de todos, o melhor central português em acção. Vítor Baía não será chamado — devido a uma teimosia irracional de Scolari que talvez um dia se perceba — e apesar do manifesto e preocupante problema que os dois guarda-redes de Scolari têm com o jogo aéreo: Quim, porque é baixo de mais, e Ricardo porque, apesar de ser um enorme guarda-redes entre os postes, é um factor de permanente instabilidade no jogo aéreo, como ficou bem patente no último Gil Vicente-Sporting. Enfim, os comandados de Luiz Felipe Scolari, após um ano e meio de preparação que se afigura ter sido rigorosamente inútil, vão ter vinte dias para se porem em forma e justificarem as expectativas que quase toda uma nação deposita neles. Têm a seu favor o factor casa, que significa o apoio do público e arbitragens tradicionalmente amigas. Mas mesmo isso, por si só, não chega. Vão ter de mostrar muito mais valor e muito mais futebol do que têm feito até aqui.
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